ALGUMA COISA ACONTECE...
Um versinho:
Mais charmosa e mais gostosa,
Que a Ipiranga com São João,
É a esquina da Vilinha,
Com a Felipe Camarão.
De rima infantil, como nós, mas de significado fiel ao que ela nos representava.
Ali era o nosso ponto de encontro. Além dos portões da minha e da casa do Dú.
Quem estivesse livre após o almoço, ia pra esquina.
E logo o grupinho ia se formando.
Sempre tinha aquele que demorava um pouco mais, já que não tinha competência para terminar logo a lição de casa. Então, era impedido pela mãe de sair. No caso, eu.
Ali ficávamos horas vendo a vida passar, literalmente, lentamente.
Não sei como está hoje, mas naquela época um carro cruzava a Felipe Camarão a cada meia hora.
Aos sábados e domingos, talvez, a cada 40 minutos.
Em dias de futebol eu levava um radinho de pilha (o tamanho não credencia chama-lo de radinho), e ficávamos lá, ouvindo o jogo até acabar. Depois, ainda tinha o sensacional humorístico Show de Rádio, transmitido pela Rádio Jovem Pan.
Não entendíamos ipsis litteris o que estava sendo narrado, a não ser os intermináveis gritos de GOOOOOOOOOOLLLLL.
Ouvíamos qualquer jogo, afinal, o mais imporante era estarmos ali jogando conversa fora.
Acho que vem daí esse gosto pelo futebol no rádio, sempre questionado pelas mulheres:
- Você está entendendo o que ele está falando? Porque eu não entendo nada...
Eu e Du, corintianos, Rubens e Piquy, são-paulinos, Douglas, palmeirense e Celso, japonês.
Sim, naquela época, japonês e futebol eram como água e óleo.
Ser corintiano não era fácil, principalmente quando os adversários eram Rubens e Piquy.
Caras chato pra cacete no quesito futebol.
Nosso camisa 9 era Geraldão, do São Paulo, Serginho. Nosso goleiro, Tobias, do São Paulo, Valdir Peres, eles tinham Pedro Rocha, e nós, Givanildo...
Jogos entre Corinthians e São Paulo era o prenúncio que a semana não seria fácil nem pro Dú, nem pra mim.
O Palmeiras também tinha um time forte, mas com o Douglas, a coisa era mais tranquila.
O interesse dele por futebol era igual ao meu pela matemática.
Mas um dia, Geraldão fez 1 e o São Paulo, nenhum. Quebrado um tabu de 5 anos sem vencer o time de Rubens e Piqui. Este último não deu as caras na rua por uns 10 dias…(risos). Rubens, com as justificativas mais inusitadas, pra não dizer estapafúrdias, quase conseguia nos convencer de que não havia tido jogo no final de semana. Um fanfarrão!!!
Ganhamos em 77, mas não foi suficiente para fugimos do bulying futebolístico.
Ruy Rei, Dulcídio, mutreta…. Tudo aquilo que já estão carecas de ouvir.
Em 1978, houve um jogo entre São Paulo e Grêmio. Sábado à tarde, no Morumbi.
Estávamos no campinho. Se bem me lembro, eu e o Piqui, ouvíamos ao jogo em cima de um muro.
Getúlio, do São Paulo, cobra uma falta com um chute forte de muito longe e faz um golaço no goleiro Corbo. O resultado final foi 3 a 1 pro SP.
Não consegui o vídeo do gol, mas o áudio, me leva imediatamente de volta aquele sábado com meus amigos (link ao final do texto).
Muitos planos saíam daquela turminha reunida na esquina.
Nada para um futuro maior do que o próximo sábado.
Quem seria o próximo a levar a bola pro campinho? Quem convidar para brincar de polícia e ladrão? Organizar um campeonato de futebol de botão, tocar campainha e sair correndo...
Fora isso, era jogar conversa fora mesmo.
Não me lembro de qualquer papo sobre as matérias que estávamos aprendendo na escola.
Ou realmente não conversávamos sobre isso ou naquele momento eu ficava “fora da área de cobertura”.